02 setembro 2009

Armando o Golpe

São seis horas da manhã e nós começamos a dançar como índios que evocam seus deuses com a mais pura energia, cigarros e bebidas espalhadas por todo apartamento, compartilhamos a compaixão e discutimos os assuntos mais malucos, entre goles e tragos toda a expressão é uma opinião em subversão a aqueles que foram nossos criadores e também educadores, seguimos uma linha torta feita pela sociedade que traça nossa personalidade e perfil, criado no centro da maior cidade do mundo somos diferentes e ao mesmo tempo iguais ao confuso mundo. Dialogamos em pretérito perfeito no presente do passado e nunca entramos em atritos, discutimos filmes, livros e idéias têm planos por toda a parte e como numa chuva cultural sentimos que crescemos em meio a pontes, vielas e ruas, jogamos bola entre carros, descemos ladeiras ao lado de corredores de ônibus e estamos acostumados a ver desconhecidos ao nosso redor, sentimos a diferença e nem ao menos nos diferenciamos deles, passam ternos, sapatos e gravatas no meio da sujeira deixada por patriotas de outros estados, mas isso não é culpa deles e sim de nossos governantes e seus nepotismos articulados em grandes e descuidados bigodes que ofendem o intelecto daqueles que conseguem enxergar a palma d’água no sertão do Coronelismo abstrato, digamos um quilombo dos palmares sem distinção de cores que escraviza aqueles que preferem não pensar em correr atrás dos seus direitos, assim caminha a humanidade.
Então numa bela manhã Armando caminha pelo parque e ao olhar pelos cantos consegue observar grandes e numerosas propagandas eleitorais e como numa música de Edith Piaf que indica humor percebe que a maioria deles é artista ou jogador falido concorrendo a cargos públicos. Ao tropeçar em uma pessoa a sua frente se surpreende ao encontrar De Paula, grande companheiro nos tempos de faculdade e ao mesmo tempo repara sua camisa que dizia em letras grandes “Ele já ganhou um Reality Show, vai ganhar no Senado também – Vote no Cuca, meu bem”. Então diante de tal surpresa e meio embaraçado por sempre ter um grande respeito por De Paula, diz:
- Grande De Paula, o que faz por aqui, meu caro amigo?
- Armando, bicho, estou desempregado e venho trabalhando na campanha do Cuca, ele é primo da minha cunhada e desde que me separei...
- Você se separou?
- Ficou sabendo não?
- Não. Quando foi isso?
- Já faz alguns anos...
- Anos?
- As coisas andavam difíceis e logo comecei a procurar a felicidade fora do casamento. Então Armando, foi então quando eu achei que estava por cima e quando chego um dia em casa mais cedo, lá estava o porteiro, que jogava bola comigo nas terças à noite pelado com minha mulher! Nem tive o que falar, você sabe que sempre fui muito racional, mas o pior ainda estava por vir: descobri que o Paulinho, meu filho, na verdade é filho de Rosildo, o tal do porteiro. Foi aí que meu mundo caiu e resolvi então refazer minha vida, graças a Deus consegui tudo o que tinha de direito, inclusive Paulinho que agora mora comigo, mas como desgraça pouca é bobagem, logo perdi o emprego. Então o Cuca apareceu na minha vida e desde então larguei a medicina e me dedico a propaganda. Sei que parece meio confuso, mas ultimamente não tinha como exercer minha carreira, pois andava bebendo demais.
- Nossa De Paula, estou surpreso!
- Fique não meu caro, agora me fala uma coisa, você já tem candidato a Deputado Federal? Por que se não tiver, Cuca na cabeça, 171171 se ele me ajuda imagina o que pode fazer por você, meu caro.
- Você sabe quais os planos de governo?
- Olha, ele é famoso, ganhou aquele reality show há uns quatro anos, deve ter algum plano, todos eles sempre possuem. Estou fazendo essa boca de urna porque ele tá meio quebrado, acabou se casando com uma dessas moças famosas que lhe tirou tudo, você sabe como é...
- De Paula meu caro, pra falar a verdade sei bem como é, mas qual a experiência desse rapaz?
- Ele foi famoso, Armando, e a mulher dele foi aquela Dani Chicletinho, lembra? Aquela mulher era um avião, hoje tá casada com aquele jogador do Dínamo de Kiev.
- Olha, não acompanho futebol do leste europeu há muito tempo...
- Então faça isso, vote nele, ele está me ajudando, me arrumou até uma clínica de recuperação de alcoolismo.
- Olha caro, não sei se vou votar nele, sabe que tenho minha linha política, ainda mais que ele é do partido que é contra o atual governo, que, diga-se de passagem, é ruim, mas tem feito bastantes coisas. Vou tentar, ok?
- Armando, tu vai tentar? Que porra de homem é você, que vai tentar ajudar um amigo? Ele me prometeu um emprego e que eu vou voltar a exercer minha função!
- Ok De Paula, eu prometo.
- Grande Armando, promessa é dívida, certo?
- Sim, promessa é dúvida...


R. Davoglio
Revisado Por Chu Mataveli